Edição 186 - ECO RIO, revista mensal
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Contagem regressiva para a Conferência RIO+20
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Flávio Miragaia Perri
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Embaixador aposentado, foi Secretário Executivo do Grupo de Trabalho Nacional que organizou a Conferência do Rio em 1992, Secretário Nacional do Meio Ambiente (hoje Ministro), Presidente do IBAMA, Secretário de Estado do Meio Ambiente do Rio. Foi Embaixador junto à Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO). Em seu período como diplomata, atuou na ONU em distintas Conferências e Assembleias Gerais.
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A um mês da RIO+20, negociadores ainda se deparam com dificuldades para encontrar um texto satisfatório que justifique a convocação da Conferência e a presença de Chefes de Estado e de Governo, no Rio, entre 20 e 22 de Junho próximo. O impasse central foi criado, sem dúvida, pela excessiva extensão de um documento chamado Rascunho Zero (Zero Draft) que se equivocou ao propor um enunciado enumerativo, necessariamente não exaustivo, de diversas atividades, setores, aspectos, conceitos incompletos, em receita desequilibrada. A RIO+20, ao contrário, exige um texto de impacto, sólido, voltado para o futuro, abrangente em sua síntese dos fatores econômico, social e ambiental que constituem os pilares do conceito do desenvolvimento sustentável.
Assumir compromissos claros de executar o que já existe bem negociado e em evolução seria a tarefa central da Conferência. Propor, para inovar, onde não há instrumentos internacionais. Partindo de sugestões numerosas, “mais de 600”, como informou o Secretário-Geral da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, Sha Zukang, o Rascunho Zero (Zero Draft) errou na dosagem e na receita, preparando um documento-base sem foco. Como apresentado, curiosamente pelo caminho inverso, compôs-se um “conjunto vazio”, conceito que ironicamente define o zero. Cabe aos governos corrigir esse rumo na mesa negociadora. Parto do princípio de que a declaração final da RIO+20 não deveria repetir exercícios anteriormente feitos com sucesso, mas considerá-los quando pertinentes. Assim é o caso da Agenda 21, adotada por consenso em 1992, que não pode ser (sem que se queira fazê-lo) substituída por documento inferior, sem foco ou aceitação. Olhado criticamente, “Zero Draft” mimetiza, na tentativa de citar atividades ou setores de atividades, o elenco muito mais equilibrado e completo da Agenda 21, entretanto ainda não universalmente aplicado. A Agenda 21 foi um dos resultados mais brilhantes da RIO-92. Seu mérito está justamente no fato de que atribui a cada país a incumbência de desenvolvê-la, global e localmente, envolvendo sua atuação internacional e ações internas, criando seu próprio quadro, soberanamente, dentro do qual, governos, empresas, ONGs e a sociedade civil como um todo e setorialmente, poderiam solidariamente agir para resolver seus problemas sócio-ambientais. A Agenda 21 constitui, nesses termos um instrumento do desenvolvimento que almeja a sustentabilidade do Planeta e do ser humano, como seu habitante privilegiado pelo atributo da inteligência racional. Em cada país, a sociedade nacional escolheria seu próprio rumo na definição de um novo paradigma de desenvolvimento, superando setorialismos, evitando prioridades excludentes, promovendo a solidariedade entre todas as partes. Tratar-se-ia de retomar esse instrumento, comprometendo a comunidade internacional que se reunirá no Rio com seus princípios e seus métodos, para ultrapassar conceitos vencidos que, já sabemos, dilapidam o Planeta e desconhecem seus limites. Essencial para sua realização seria a cooperação internacional, angariando e disponibilizando meios financeiros e tecnológicos, para a superação do problema do desenvolvimento que abate esforços de 2/3 dos países no mundo e a maioria da população do Planeta. Essencial seria ampliar os programas de atendimento aos que têm fome, primeira etapa na luta para a superação da miséria. Seria por essa via, que um novo índice social e ambientalmente mais acurado poderia vir a ser criado para medir o grau de satisfação humana de suas necessidades básicas (e aí me parece claro que se incluiriam a segurança alimentar, a saúde individual e coletiva, a educação como vetores essenciais) e o nível de sustentabilidade ótima dos bens disponibilizados pelo Planeta, o estágio e a organização de seu aproveitamento.Tal índice ofereceria não apenas os valores do crescimento, mas tomaria o ser humano e o Planeta como referências fundamentais. Tratar-se ia de estabelecer a definitiva transparência de todos os parâmetros para a ação dos Estados no plano internacional e dos Governos no plano nacional. Atividades industriais e urbanas seriam enriquecidas por essa orientação e o cidadão teria a sua disposição um medidor confiável, para sua avaliação pessoal das atividades de seus governos e dos demais atores econômicos, com vista à sua sobrevivência. No plano político esse novo índice garantiria a transparência dos resultados e a consolidação da democracia. Equivoca-se finalmente o documento-base ao incluir elementos do que por enquanto parece apenas uma combinação de palavras, no termo cunhado por interesse dos países da OCDE no foro do PNUMA, sabidamente financiado pelos países desenvolvidos. Trata-se da ideia de uma “Economia Verde”, que ninguém definiu de maneira clara, cujos limites não estão estabelecidos e que parece ter sido proposta como alternativa indesejável ao desenvolvimento sustentável. Por isso mesmo, a agenda da RIO+20 qualificou esse enunciado vago, submetendo-o ao conceito do desenvolvimento sustentável e ao combate à miséria. Recentemente, o Secretário do Ambiente do Rio, Carlos Minc, ofereceu contribuição pessoal de valor, para circunscrever essa combinação de palavras a ações de promoção do desenvolvimento sustentável, exemplificando medidas positivas, como a “Carta dos Ventos”, de 2009, que “elencou 12 medidas para viabilizar a energia eólica no Brasil”; recordou resultado de batalha que empreendemos, com Eduardo Carvalho e Fábio Feldmann, quando éramos Secretários de Meio Ambiente nos Estados do Rio, Minas e São Paulo, criando o Comitê da Bacia do Rio Paraíba do Sul e trabalhando pela criação de uma taxa de recursos hídricos na nova Lei das Águas – que então se negociava – cuja destinação seria (como se tornou) os Comitês de Bacia. Hoje se sabe que alguns deles aplicaram sabiamente esses novos recursos no financiamento de proprietários ribeirinhos, na recomposição de matas ciliares, ou em obras de saneamento municipais. No plano internacional é necessário, entretanto, frear o livre curso dessa combinação de palavras, evitando que venha a implicar restrições ao comércio internacional ou a mais livre disposição de tecnologias para o desenvolvimento sustentável, o que poderia acontecer se países desenvolvidos isoladamente ou em bloco decidissem unilateralmente, pelos Governos de países em desenvolvimento, onde e como aplicar recursos financeiros e tecnológicos internacionais. Com a Agenda 21 dispomos de instrumento aprovado internacionalmente como facilitador do planejamento, com ampla participação de todas as partes interessadas, nos planos global, nacional e local. Pode ser também um instrumento de boa-governança. Tratar-se-ia de realizá-la com vistas ao estabelecimento de um novo paradigma civilizatório, com efeitos econômicos, sociais e ambientais. Sobre a chamada “Economia Verde”, se trataria apenas de garantir que não passe de um plano de metas a ser estabelecido nacionalmente, por país, utilizando medidas de governo e bom senso empresarial (fiscais, financeiras, creditícias, tecnológicas, sociais, no plano dos governos, e de gestão da produção e equilíbrio do consumo, no plano empresarial), para viabilizar o desenvolvimento sustentável. |
segunda-feira, 21 de maio de 2012
Contagem regressiva para a Conferência RIO+20
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